segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Pequeno parágrafo sobre o céu


No intratável dos astros, nessas esferas candentes de outrora, procuro os sons da minha voz que tenta dizer as coisas deste mundo. O passado, os astros, esse silencioso e obtuso grito em forma de pequenas esferas que cruzam o nosso céu, só é palpável na sua forma mais banal: a palavra. O caos inerme é transformado em cosmos, e nem mesmo nossa incapacidade de se dar conta de que é o caos aquilo para além do qual não podemos sentir é deixada ilesa: ganha o nome que nega o caos, mas que é incapaz de negar esse passado que cruza a abóbada no mais profundo azul: nada. Os sons de um suspiro doce que ainda há pouco escutava e que agora são apenas ecos, são a sombra que tocam o presente; o brilho evasivo de um olhar que evita o toque do caos dura o instante mesmo em que foge e toda a eternidade; qualquer sinal do grito do caos (que, de maneira tola, ousamos chamar universo) se vai para sempre e permanece sem cessar. Não sobram palavras. Vivemos esquecendo o caos que nos esquece e, como certa vez Picabia viu em uma faísca que cruzava o céu, percebo que "a vida só tem uma forma: o esquecimento".

Imagem: Vincent Van Gogh. Café na praça do forum de Arles. 1888.  Rijksmuseum Kröller-Müller, Otterlo.

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