quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Pequeno parágrafo sobre o labirinto


Era como se andasse perdido num labirinto plano, construído com placas de vidro através das quais a saída se insinuava de maneira mordaz. Senti como se nenhum sentido pudesse ser dado à vida do senhor no labirinto. Perdia-se dentro da ausência - aquela mesma, branca, tão pegada e aconchegada nos braços do poeta - que, pensando bem, era uma presença demasiado pesada de todas as suas memórias em um único ponto: o esquecimento. De pronto, na imagem do labirinto, sorria o mesmo sorriso de cinco minutos antes, pelas mesmas histórias, por ter chegado no mesmo ponto sem saída do labirinto de vidro. Olhava-me com olhos cuja opacidade vítrea me lembrava as bolinhas de gude da infância. Nos seus olhos esquecidos saltavam-me memórias, eis a tragi-comicidade disto a que usamos chamar vida humana. "Toda felicidade é memória e projeto", dizia Cacaso numa sessão de cinema mudo. Eu, da minha parte, não trago retratos que já estavam comigo antes mesmo de serem tirados. Não! Tenho diante de mim apenas um mar de rostos que já me são estranhos e uma vontade de lembrar e de projetar. Ledo engano de quem, viciado em memória, se dá conta de que ela é tão somente um sopro que embaça e logo some numa das paredes desse labirinto de vidro...

Imagem: Tiziano. Amor sagrado e amor profano (detalhe). 1514. Galleria Borghese, Roma.

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